Não acredito que um brasileiro que já tenha visitado um país estrangeiro tenha se esquivado da brincadeira do samba e do futebol. Como se essa parte da nossa cultura fosse tudo sobre nós.
Quando os gringos aprendem mais sobre os brasileiros, eles se surpreendem com nossa aparência diversa, com nossa riqueza e nossa capacidade de entender outros idiomas e até mesmo de estarmos ali nos país deles.
Generalizações acontecem com todas as culturas, sim, é importante admitir. Mas, e quando só conhecem a generalização sobre seu país? E quando, sendo mulher brasileira, um olhar malicioso chega até você? Até onde é tudo bem generalizar um povo e neutralizar o descaso com tantas culturas?
Me coloco no meu lugar também, difícil não cair em algum comportamento racista. Como humanidade ainda não estamos preparados a olhar com sincera compaixão para com os diferentes de nós.
E a discriminação como imigrantes vai muito além dos atos abertamente hostis. Ela se manifesta de maneiras sutis, mas igualmente prejudiciais, que corroem o senso de pertencimento e bem-estar.
Quero destacar as micro agressões que são comentários ou ações aparentemente inofensivas, mas que carregam mensagens discriminatórias. Falas como: “Você fala inglês muito bem para um brasileiro”, ou assumir que o imigrante tem menos conhecimento, ou capacidade por conta do pais de origem, esses estereótipos podem levar a julgamentos injustos e discriminação em diversas áreas da vida e são altamente graves. Podem minar nossa auto-estima e mais são situações que quase nunca sabemos como nos defender.
Nos cabe, então, estudar e conhecer melhor outras culturas, principalmente a daqueles ao nosso redor. Demonstrando respeito, podemos então ensinar a nossa cultura também, para evitarmos cometer os mesmos erros que o deles.
Foi o que fiz quando promovi a festa junina em Los Angeles, ao promover um evento de fundraising (respeitando a cultura americana que tem esse costume) dissipei o costume caipira, nossas comidas, nossos trajes e nossas músicas. Fiz isso porque é minha festa favorita e que acabou sendo uma oportunidade para pessoas do mundo todo conhecerem um pouco mais sobre os brasileiros e descobrirem que somos mais do que o Carnaval.
Na minha perspectiva, valorizar nossa cultura além do futebol e do carnaval é celebrar a nossa diversidade como povo.
Nos meus dois últimos episódios conversei sobre pertencimento e como isso é importante quando a gente sai do Brasil. Pertencer é mais do que viver, é ser visto e validado. É ser parte de algo. Por isso mesmo esse tema é tão comum em nossas vidas que é tão difícil de ser agraciado quando estamos fora.
E uma vez uma moça me perguntou para o seu projeto de TCC o que eu havia reparado de mais comum entre as mulheres que eu havia conversado. E eu respondi sem dúvidas que era a necessidade de pertencimento.
Quando a gente muda de país as coisas que mais nos dão chão e nos garantem segurança ficam pra trás. E estar em qualquer lugar novo, seja outra cidade, estado, ou país nos deixa vulneráveis.
E aí, a pergunta óbvia agora seria: Então o que fazer para nos sentirmos menos vulneráveis? Será que é possível?
Uma resposta fácil é manter os vínculos com quem ficou lá, continuar ouvindo músicas brasileiras que geram emoção e a que mais funciona pra mim, comer o que te faz sentir pertinho de casa.
Agora, mesmo isso nos ajudando e diminuindo a saudade, não faz com que a gente se sinta mais seguro. Não muda o fato de que não estamos lá.
Então a sensação de não pertencer que muitos imigrantes experimentam: a dificuldade de se integrar completamente em uma sociedade estrangeira, a luta para manter a conexão com suas raízes e tradições brasileiras, e o sentimento de estar “entre dois mundos”, sem se sentir completamente em casa em nenhum dos dois; vai estar sempre presente, às vezes em doses maiores que outras.
Então, nosso papel como imigrantes é buscar um novo jeito de ser brasileiro, talvez com um português com pitadas de sotaque gringo, um estilo de se vestir mais diverso, uma nova perspectiva de humor, uma nova noção de como lidar com as pessoas e a burocracia. E o mais importante, na minha opinião, manter viva a língua nas crianças brasileiras nascidas fora do Brasil.
Quantos filhos e filhas de imigrantes brasileiros vejo admirarem o Brasil tanto quanto eu que sou de lá.
É difícil pertencer, seja no Brasil ou fora dele. A verdadeira essência do pertencimento não reside em um passaporte ou em um lugar geográfico, mas sim na forma como nos conectamos uns com os outros. Que possamos, então, cultivar um diálogo aberto e honesto sobre nossas experiências, que possamos nos esforçar para entender as perspectivas dos outros e que possamos construir um mundo onde todos se sintam vistos, validados e amados. Porque, no final, é o amor e a segurança que buscamos, seja no Brasil ou em qualquer outro lugar do mundo.